Escrito nos raros momentos de folga de uma jornada fatigante.

Consulte o dicionário do cinismo, no rodapé do blog.

Divulgação literária e outros babados fortes

Versos cretinos, crônicas escrotas e contos requentados. O resto é pura prosa.

sábado, 28 de novembro de 2009

O AI -5, ao vivo e em tons de cinza chumbo

Quem não viveu aqueles anos de chumbo grosso, agora pode clicar nesse link e mergulhar na nossa história recente:


Como aperitivo, dou uma sucinta biografia de um dos participantes daquela reunião, o famigerado Delfim.



O então Ministro da Fazenda, Delfim Netto

Durante o regime militar, recebeu dos inimigos a alcunha de Dª Maria a Louca. Foi alvo de um relatório reservado, o Relatório Saraiva, que denunciou os atos de corrupção que teria cometido como embaixador brasileiro em Paris. Naqueles bons tempos, a comissão era de apenas 10%.

Depois da saída dos militares, foi eleito cinco vezes consecutivas deputado federal.

Em 2005, abandonou o Partido Progressista e ingressou no PMDB, o que gerou protestos da base peemedebista, em parte pela forte ligação de seu nome com a ditadura militar.

Após a reeleição de Lula, em 2006, Delfim  se tornou um interlocutor privilegiado do presidente. Houve especulações de que  estaria sendo sondado para ocupar algum ministério ou a presidência do BNDES.

É por essas e por outras, que alguns dizem que mergulhar na nossa história recente pode causar micoses e urticárias. Sem contar com o risco de se contrair cólera.






terça-feira, 24 de novembro de 2009

Capítulo 3 segunda parte


O álbum de fotos


Zé Dirceu, Wladimir Palmeira e Genoino, hoje lideranças nacionais do PT, são velhos conhecidos. Em 1968, em um sítio em Ibiúna, São Paulo, eles participaram do lendário XXX Congresso da UNE – União Nacional dos Estudantes. A polícia descobriu o local e os setecentos e poucos delegados foram presos e colocados em fila, no meio da lama, para serem revistados e enviados para o Presídio Tiradentes.

Um estudante ficava repetindo a música: “Aqui dá pra rir, dá pra chorar... enquanto todo o resto ria. De repente, passou uma camionete C-14 da polícia, com Wladimir, Travassos , Zé Dirceu e o então Presidente da UBES – União Brasileira dos Estudantes Secundaristas, Antônio Guilherme Ribeiro Ribas. Os estudantes passaram então a entoar o refrão: “A UNE somos nós, nossa força, nossa voz”, para demonstrar que estavam unidos, apesar das divergências que pudessem haver entre suas lideranças.

Quando um dos policiais que comandavam a operação identificou o Presidente da UBES, Antonio Ribas, disse mais ou menos o seguinte: “Você não tem jeito mesmo, seu Ribas, foi preso entregando panfletos no Desfile de 7 de setembro (...) foi solto na véspera desse Congresso da UNE. Hoje, três dias depois de ser solto, já é preso novamente. Você é um caso perdido” . De fato, felizmente, ele era um caso perdido. No dia seguinte, os jornais estamparam a foto de Guilherme, ao lado de José Dirceu, sendo transportados para o Presídio Tiradentes. Infelizmente, essa não foi a única foto tirada. A polícia montou um álbum de fotografias do Congresso, que mais tarde seria o pesadelo dos militantes clandestinos.

Ribas, Zé Dirceu, Wladimir Palmeira e Travassos se tornaram conhecidos como “o grupo dos quatro”. Guilherme foi condenado a um ano e seis meses de prisão, acusado de organizar o Congresso. A maioria dos presos foi solta através de habeas-corpus, mas o AI-5 , decretado numa sexta-feira 13 de dezembro de 68, suspendeu esse instrumento e manteve o grupo dos quatro na cadeia.

Quando ocorreu o seqüestro do embaixador norte-americano, em setembro de 1969, Guilherme estava no Presídio Tiradentes. Aqui existe um ponto obscuro em sua história. Alguns dizem que ele seria incluído na lista dos presos a serem libertados, outros dizem que não.

Seja lá como for, no final de 1969, Diógenes Arruda e Paulo de Tarso Venceslau , se juntaram ao Guilherme numa das celas do Presídio Tiradentes. A cela tinha até nome, “Monteiro Lobato”, em homenagem a um antigo hóspede. Paulo de Tarso nos conta:

“Durante todo tempo que estivemos presos mantivemos [ele e Ribas] um bom relacionamento. Diferente foi o relacionamento com Arrudão, sempre marcado por altos e baixos, porém com muito respeito”. (...) “Na época, minha organização - ALN - tinha críticas ao PC do B, considerado uma variante chinesa do reformismo soviético. (...) Como não sabia da iniciativa em Goiás e Sul do Pará, eu achava que o discurso de Arruda não passava de retórica. Difícil foi ter de engolir que Ribas saiu da prisão e seguiu logo depois para a área rural. Ninguém imaginava que aquilo pudesse acontecer”.

Guilherme foi solto em abril de 1970. Talvez tenha sido o último preso de Ibiúna a sair do cárcere. Imediatamente, entrou na clandestinidade. Primeiro foi para uma fazenda da família em Limeira (SP) e depois seguiu para Duque de Caxias, baixada fluminense. Antes de embarcar para o seu destino de guerrilheiro nas matas do Araguaia, fez uma última reunião com a família. Naquela noite afirmou: “voltarei à frente de uma revolução ou não voltarei”.

Quando Ribas chegou à região do Rio Gameleira, em outubro de 1970, adotou o nome de Zé Ferreira. Como não havia condições de ficar todo mundo numa mesma casa, comprou um castanhal a 24 km. do rio, que passou a ser conhecido como “O Castanhal do Zé Ferreira”. A área era relativamente deserta e poderia abrigar mais companheiros.



sábado, 21 de novembro de 2009

O Araguaia do Ceará

Estou reproduzindo como postagem, pela sua importância, um comentário que recebi:

SÍTIO CALDEIRÃO, O ARAGUAIA DO CEARÁ: GENOCÍDIO ESQUECIDO PELO PODER PÚBLICO!

No CEARÁ, para quem não sabe, houve também um crime idêntico ao do “Araguaia”, contudo em piores proporções, foi o MASSACRE praticado por forças do Exército e da Polícia Militar do Ceará no ano de 1937, contra a comunidade de camponeses católicos do Sítio da Santa Cruz do Deserto ou Sítio Caldeirão, que tinha como líder religioso o beato JOSÉ LOURENÇO, seguidor do padre Cícero Romão Batista.

A ação criminosa deu-se inicialmente através de bombardeio aéreo, e depois, no solo, os militares usando armas diversas, como fuzis, revólveres, pistolas, facas e facões, assassinaram mulheres, crianças, adolescentes, idosos, doentes e todo o ser vivo que estivesse ao alcance de suas armas, agindo como feras enlouquecidas, como se ao mesmo tempo, fossem juízes e algozes.

Como o crime praticado pelo Exército e pela Polícia Militar do Ceará foi de LESA HUMANIDADE / GENOCÍDIO / CRIME CONTRA A HUMANIDADE é considerado IMPRESCRITÍVEL pela legislação brasileira bem como pelos Acordos e Convenções internacionais, e por isso a SOS - DIREITOS HUMANOS, ONG com sede em Fortaleza - Ceará, ajuizou no ano de 2008 uma Ação Civil Pública na Justiça Federal contra a União Federal e o Estado do Ceará, requerendo que sejam obrigados a informar a localização exata da COVA COLETIVA onde esconderam os corpos dos camponeses católicos assassinados na ação militar de 1937.

Vale lembrar que a Universidade Regional do Cariri – URCA, poderia utilizar sua tecnologia avançada e pessoal qualificado, para, através da Pró-Reitoria de Pós Graduação e Pesquisa – PRPGP, do Grupo de Pesquisa Chapada do Araripe – GPCA e do Laboratório de Pesquisa Paleontológica – LPPU encontrar a cova coletiva, uma vez que pelas informações populares, ela estaria situada em algum lugar da MATA DOS CAVALOS, em cima da Serra do Araripe.


Frisa-se também que a Universidade Federal do Ceará – UFC, no início de 2009 enviou pessoal para auxiliar nas buscas dos restos dos corpos dos guerrilheiros mortos no ARAGUAIA, esquecendo-se de procurar na CHAPADA DO ARRARIPE, interior do Ceará, uma COVA COM 1000 camponeses.


Então qual seria a razão para que as autoridades não procurem a COVA COLETIVA das vítimas do SÍTIO CALDEIRÃO? Seria descaso ou discriminação por serem “meros nordestinos católicos”?


Diante disto aproveitamos a oportunidade para pedir o apoio de todos os cidadãos de bem nessa luta, no sentido de divulgar o CRIME PERMANENTE praticado contra os habitantes do SÍTIO CALDEIRÃO, bem como, o direito das vítimas serem encontradas e enterradas com dignidade, para que não fiquem para sempre esquecidas em alguma cova coletiva na CHAPADA DO ARARIPE.

Dr. OTONIEL AJALA DOURADO
OAB/CE 9288 – (85) 8613.1197
Presidente da SOS - DIREITOS HUMANOS
www.sosdireitoshumanos.org.br

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Posse na Academia



Amanhã é a posse da minha amiga, a poeta Clevane Pessoa, no dia 18 de novembro de 2009, às 16h:00, na rua dos Timbiras 1560, Conj. 703/704 - em Belo Horizonte/MG - onde a escritora será saudada por Elisabeth Rennó, Presidente da Academia Municipalista de Letras AMULMIG.

sábado, 14 de novembro de 2009

Capítulo 3 - Primeira parte

O Destacamento do Osvaldão

José Genoino Neto, o ex-presidente do PT, conta que deixou São Paulo no dia em que a Seleção Brasileira, tri-campeã do mundo no México, chegou à cidade para desfilar no Anhangabaú. Ele aproveitou o momento para pegar um ônibus na Rodoviária de São Paulo com destino a Campinas. Genoino sabia que o PC do B preparava a luta armada no campo, apresentou-se como voluntário e foi enviado para essa missão. Quando entrou no ônibus, ele não conhecia o seu destino final, só a sua primeira escala. Lá teria que cobrir um ponto* e receber mais instruções. Em Campinas, soube que ia para Anápolis.
*Cobrir um ponto era comparecer na hora marcada a um local previamente combinado. Às vezes, as pessoas se identificavam através de senhas. Em caso de desencontro, poderia haver uma alternativa, um ponto em outra data e/ou local.

Em Anápolis, Genoino encontrou com um velho conhecido do movimento estudantil cearense, Glênio, que ia para a mesma missão. Os dois foram contatados por José Humberto Bronca, um ex-metalúrgico gaúcho, que os iria conduzir, daí em diante. Passaram um dia fazendo pequenas compras: remédios, facão, machado, panelas e mantimentos. Depois, seguiram de ônibus até Imperatriz, no Maranhão, fazendo de conta que não se conheciam.

Em Imperatriz, se hospedaram em hotéis diferentes. Gastaram mais três dias fazendo compras, separados. Só então, Genoino soube que entraria na mata pelo rio, num barco. A viagem de Imperatriz para Porto Isabel durou cinco dias; primeiro descendo o Rio Tocantins, até São João do Araguaia, depois subindo o Rio Araguaia. No barco, os três já se apresentavam como conhecidos. Glênio e Genoino contavam aos camponeses que ia morar com um tio, no sul do Pará.

De Imperatriz em diante, não havia mais pontos de referência: só a mata e o rio. A selva ia engrossando, à medida que o destino final se aproximava. Os últimos 14 quilômetros foram feitos a pé, porque o Araguaia havia baixado e a cachoeira de Santa Isabel não estava transponível.

Bronca já estava na região desde 69 e era muito bem relacionado com os moradores. De cada um que encontrava, recebia a mesma pergunta: - o Osvaldão, como vai? - O Negão está bem? - E o Mineirão? Glênio e Genoino se perguntavam quem seria esse personagem tão popular.

Finalmente chegaram a um pequeno rancho, numa região de capoeira, onde um negão fritava um bife de veado, em companhia de um velhinho de 60 anos. A recepção foi calorosa. Genoino recebeu arma, facão e botina, foi colocado a par das características da região e ganhou de lembrança do seu tio uma folhinha do calendário. A data era auspiciosa, 26 de julho* . O tio, ele soube mais tarde, era Amazonas.
*26 de Julho é o nome do principal movimento rebelde cubano. Nessa data houve o fracassado ataque ao quartel de Moncada, que terminou com a morte de vários rebelde e a prisão de Fidel Castro

O negão até hoje é uma figura lendária no Araguaia. Seu próprio físico o tornava inesquecível: negro, quase dois metros de altura, sapato 48, dotado de enorme força física (havia sido campeão de box pelo Botafogo). Em 62, quando foi estudar engenharia na Tchecoslováquia, foi tema de um livro “O homem que parou a cidade”, do escritor tcheco Cytrian Ekwensi.

Sandra Negraes Brisolla, professora da Unicamp, que o conheceu em Praga, lembra de um relato curioso: ”Quando cheguei a Praga, os meninos passavam saliva no dedo e esfregavam meu braço, para ver se a cor da minha pele saía. Nunca tinham visto um negro – contou [Osvaldão]”. Foram estas características tão marcantes que o afastaram das cidades, onde dificilmente poderia se esconder da repressão.

Assim que retornou da Tchecoslováquia, Osvaldão entrou para o PC do B. Como vimos, desde 65, ele já estava envolvido no trabalho de campo do partido, no norte de Goiás. No Araguaia, ele foi o primeiro a chegar, ainda em 66. Atuando como garimpeiro e mariscador (caçador de peles), conhecia a área profundamente. Em 69 comprou uma posse às margens do Rio Gameleira, na região de Couro D’antas.

Amazonas era o Secretário Geral do PC do B. Paraense, nascido em 1912, João Amazonas entrou para o partido em 1935. Ele e Pedro Pomar atuavam no Pará. Em 1940, os dois foram presos, junto com outros dirigentes locais. Segundo relato do próprio Amazonas: “Na prisão, recebemos a notícia da invasão da União Soviética pela Alemanha hitlerista. Nossa indignação foi enorme. Reunimos, nesse mesmo dia, e juramos sair da prisão para continuar a luta de vida e morte contra o nazismo.” .

A fuga deu certo e os dois se dirigiram para o Rio de Janeiro, passando pela região do Bico do Papagaio. Foi o primeiro contato de Amazonas com o futuro cenário da guerrilha. No Rio, encontraram-se com a Comissão Nacional de Organização Provisória (CNOP), dirigida por Maurício Grabois e Amarílio Vasconcelos. Em seguida, contataram Diógenes Arruda, que tentava reorganizar o partido em São Paulo. Era a agonia da noite (título do segundo volume da trilogia de Jorge Amado). O partido estava desmantelado e os remanescentes eram caçados pela polícia de Getúlio.

Graças aos esforços da CNOP, em agosto de 43, foi realizada a 2ª Conferência Nacional do PCB, conhecida como “Conferência da Mantiqueira”. “Segundo Dinarco Reis, a reunião” foi realizada numa pequena cafua de telha-vã e chão de terra, com sala, quarto e cozinha, local bastante exíguo para tantas pessoas (...) Dormíamos no chão de terra forrado por sacos e jornais. À noite o frio castigava duramente, pois era inverno nessa região bastante alta”.” Nesta Conferência, Amazonas foi eleito para o Comitê Central.

Em 45, finalmente chegou a luz no fim do túnel (título do último volume da trilogia de Jorge Amado): vieram a anistia e a legalização do PCB. João Amazonas foi eleito deputado federal para a Assembléia Constituinte, juntamente com Maurício Grabois e Diógenes Arruda. Depois da cassação dos deputados comunistas, já no governo Dutra, o trio assumiu a direção cotidiana do Partido.

Em 1968, 27 anos depois de sua fuga, Amazonas retornou à região. Inicialmente, ele se estabeleceu num povoado chamado Faveira, às margens do Rio Araguaia. Mais tarde se deslocou para a posse de Osvaldão. Conheci Amazonas uma década depois de sua saída do Araguaia. Seu aspecto físico era o de um típico caboclo: baixo, franzino, rosto largo, com traços indígenas. Na região, ele poderia passar despercebido, a não ser pela sua voz, que, embora fraca, prendia a atenção de todos à sua volta e pela autoridade que dele emanava.

Uma das primeiras tarefas dos dois sobrinhos foi construir uma casa, a 150 metros do Rio Gameleira, onde Osvaldão, Glênio, Genoino, Amazonas e Bronca foram morar.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

A orientação dos gatos



Cortázar e Flanelle

Flanelle era uma gatinha de rua que adorava flanar. Cortázar era um grande escritor que morava no apartamento de Flanelle, em Paris. Ela criou uma brincadeira, que ele, que não era de todo bobo, acabou aprendendo. Primeiro ele abria a porta e a deixava do lado de fora. Depois, conversavam  pelo vidro, enquanto ela pedia para entrar e ele fingia que não ia deixar. Um morrendo de rir do outro.
Pichuco é um gato vira-lata, que nunca leu Cortázar e nem conheceu Flanelle. Todo dia ele me pede para sair, atravessa a sala pelo mesmo caminho e vai para a garagem. Uma hora depois,  abro a porta e peço para ele entrar, enquanto ele finge que não quer.
O Pichuco original era um gato vira-lata que vivia num sebo em Buenos Aires. Um dia, ele simplesmente surgiu e escolheu seu dono e o lugar onde iria reinar. Quando o conheci, ele dormia no balcão, cansado de passear em cima dos livros. Em sua homenagem, batizei um gatinho que chegou tremendo de frio, dentro de uma caixa de sapatos, trazido por um vizinho.
Cortázar escreveu A orientação dos gatos, que no Brasil ganhou uma capa com um desenho de um gato, sósia do Pichuco brasileiro. Numa outra ida à Buenos Aires, comprei o livro com a foto de Flanelle brincando.
Assim são os gatos. Aparecem e  te escolhem, sem um motivo aparente. Cortázar se deu conta que eles eram antenas. Ligam e captam pontos dispersos, separados no espaço e no tempo, soltos na tal da realidade concreta.  Os gatos passeiam por uma teia muito mais significativa.
Alguém que for bastante bobo, pode achar que eles são absolutamente inúteis. Se você for sábio o suficiente, o seu gato te ensinará uma brincadeira. Ou deixará um presente, no pé da cama: um prendedor de roupas, uma borboleta morta. Um hieróglifo.
Eles são mensageiros muito sérios. Os seus antepassados egípicios foram fixados em sua postura hierática, prescrutando o destino dos mortais, em cima de seus longos pescoços. Solte uma risada inapropriada, quando  estiver brincando com seu gato e ele se retirará ofendido. Existe um tom certo, uma etiqueta que Cortázar dominava e que permitia que ele e Flanelle passassem horas se divertindo.
Durante a maior parte do tempo, o seu gato vai fazer o que todo gato faz melhor, dormir. Dependendo do quanto ele confia em você, uma hora, você poderá surpreendê-lo, fitando um ponto invisível, recebendo uma nova mensagem. Outra hora ele olhará dentro de você e te verá todo e se você for uma boa pessoa, ele irá deitar no seu colo ronronando e o seu juízo será mais definitivo do que qualquer verbete numa Wikipédia, do que qualquer necrológico.
Dizem que Flanelle lamentou muito a morte de Cortázar.

sábado, 7 de novembro de 2009

Capítulo 2 - A composição dos destacamentos

Ao deslocar mais de 70 militantes para a região do Araguaia, o PC do B pretendia formar três destacamentos, cada um com 23 combatentes: um comandante, um vice-comandante, e três grupos de sete guerrilheiros. Previa-se que, ao final de 1972, os efetivos estivessem completos, a área mapeada e o treinamento militar concluído. Caberia ao partido escolher como e quando iniciar a luta armada.
Ângelo Arroyo era um operário paulista que ingressou no PCB em 1945, com 17 anos. Em 54, foi eleito membro do Comitê Central. Desde o início, se opôs as teses de Khruschev e, em 62, participou da reorganização do partido. No PC do B, era membro do Comitê Central e de sua Comissão Executiva. Fazia parte da Comissão Militar, a qual os três destacamentos estavam subordinados. Ele sobreviveu ao aniquilamento da guerrilha e escreveu um relatório, o chamado Relatório Arroyo, uma de nossas fontes primárias.
Para facilitar a leitura, além das tabelas que constam nesse capítulo, elaboramos um encarte. Ao lado do nome dos militantes, colocamos os nomes de guerra com os quais eram conhecidos entre os moradores e entre os próprios companheiros. O Relatório Arroyo utiliza quase sempre esses nomes de guerra. Para evitar confusões (existia um Zezinho do destacamento A e um do destacamento B, por exemplo), nós fixamos um nome, que, se for o caso, virá sempre em itálico.



























































Arroyo coloca 22 militantes no Destacamento A, comandados por André Grabois (Zé Carlos) e tendo Antônio de Pádua Costa (Piauí) como vice-comandante. Danilo Carneiro, (Nilo)*, estava autorizado a deixar a área assim que começassem os choques armados, portanto Arroyo não o incluía como combatente. Lúcia Regina de Souza Martins (Regina) **, esposa de Lúcio Petit da Silva (Beto), havia deixado a região para se tratar em Anápolis. Ela fugiu do hospital e voltou para a família em São Paulo. Também não entra na contagem dos combatentes. Desse modo chegamos ao número exato, 22 militantes. Nem sempre conseguimos estabelecer a data de chegada com precisão.

O destacamento B







O destacamento B tinha 21 militantes, Osvaldo Orlando da Costa (Osvaldão) era o Comandante e José Humberto Bronca (Zeca, Fogoió) o vice-comandante. Walquíria (Walk) foi a última guerrilheira a ser morta pelo exército. Michéas (Zezinho) é um dos poucos sobreviventes da guerrilha. Ele ajudou Arroyo a sair da área e permaneceu clandestino em São Paulo, sem contato com o PC do B. Mais de vinte anos depois desses acontecimentos, tornou pública a sua história. Sua memória, no entanto, apresenta falhas e lacunas.

O destacamento C





































Esse destacamento foi o último a ser formado, sendo que dois militantes chegaram no dia 18 de abril de 72, uma semana depois do primeiro ataque do exército ao Destacamento A. O seu comandante era Paulo Mendes Rodrigues (Paulo) e o vice-comandante José Toledo de Oliveira (Vitor). Teresa Cristina Albuquerque (Ana) * era casada com Pedro Albuquerque Neto (Pedro) **. Desde que chegou, manifestou sua inconformidade com a tarefa. Os dois abandonaram a área ainda em 71. No total, assim que começaram as ações militares para o Destacamento C, ele contava com 20 combatentes.

A Comissão Militar





































A Comissão Militar original era formada por oito membros, sendo que dois exerciam a função de guardas. Arroyo não menciona os nomes dos seus componentes e excluí João Amazonas e Elza Monnerat da contagem. Ambos haviam ido para São Paulo e estavam retornando separadamente. A vinda deles coincidiu com os primeiros ataques do exército. Elza levava dois militantes que iriam se integrar à guerrilha: Rioko Caiano e Eduardo Monteiro Teixeira, presos logo ao chegar. Ela conseguiu retornar a Anápolis, a tempo de avisar João Amazonas, e dali voltaram para São Paulo.
Na verdade, a estrutura das forças guerrilheiras era mais complicada, pois havia um Bureau Político ao qual a Comissão Militar estava subordinada. Ao que parece, com o desenvolvimento da guerrilha, essas estruturas iriam se ampliar e se diferenciar. Para simplificar, englobamos as duas sob o nome único de Comissão Militar - CM.